Pastoral Nacional do Povo da Rua
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Pastoral em Olinda divulga carta por ocasião dos 5 anos de missão

"Carta da Pastoral do Povo da Rua – 5 Anos de Profecia e Missão

A Pastoral do Povo da Rua celebra cinco anos de missão profética em Olinda. Esta carta é um chamado à memória, à resistência e à fé encarnada nas ruas, becos e praças.
Reafirmamos nosso compromisso com os empobrecidos, com a justiça social e com o Evangelho vivido na prática."

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Carta Pastoral – Olinda, 03 setembro de 2025.
 

“A rua como lugar de encontro com o Cristo invisível”

 

Queridos irmãos e irmãs,

Ao longo destes cinco anos de missão junto à população em situação de rua em Olinda/PE, fui desafiada a rever meus conceitos sobre presença, escuta e evangelho. A rua, muitas vezes vista como espaço de abandono, revelou-se para mim como território sagrado — onde o Cristo se manifesta nos rostos marcados pela dor, pela luta e pela esperança.

A convivência diária me permitiu conhecer a heterogeneidade dessa população e identificar inúmeras violações de diretos daqueles que vivem nas calçadas, praças e marquises da cidade.

Mas essa missão não se limita à escuta nas ruas. Também estive presente em espaços de controle social — conselhos, comitês, fóruns — onde se discute e monitora a implementação de políticas públicas. E é com dor no coração que reconheço: temos lutado muito para conquistar muito pouco. As pautas são as mesmas de cinco anos atrás. Os rostos mudam, mas a indiferença permanece.

A impressão que se impõe é a de que não há compromisso real dos gestores públicos — em todas as esferas — com a transformação da realidade das pessoas em situação de rua. As poucas políticas existentes são frágeis, mal executadas e incapazes de promover autonomia. Pior: parecem desenhadas para manter a dependência, alimentar um sistema perverso onde a pobreza gera lucro para alguns e capital político para outros.

E aqui, preciso dizer com sinceridade:
Até mesmo a Igreja, que se diz corpo de Cristo, muitas vezes falha em sua missão. A preferência pelos pobres, tão proclamada nos púlpitos, não se traduz em presença concreta nas ruas. Falta escuta, falta compromisso, falta coragem de romper com a comodidade institucional.

Provoco a todos nós, como comunidade cristã:
Que tipo de Igreja somos, se não nos indignamos com a miséria que se perpetua?
Que Evangelho estamos anunciando, se não confrontamos as estruturas que lucram com o sofrimento?
Será que não estamos, ainda que inconscientemente, colaborando com esse sistema ao silenciar diante dele?

 

Também preciso compartilhar uma inquietação que tem crescido em mim ao longo dessa caminhada: a atuação dos órgãos de justiça. Reconheço que há profissionais comprometidos com os direitos humanos, que lutam com coragem e ética. Mas o sistema como um todo se mostra lento, burocrático e, por vezes, excessivamente tolerante diante de violações graves.

Essa morosidade institucional gera desânimo. E mais do que isso: gera descrédito. Como falar de justiça social para todos e todas, se os mecanismos que deveriam garanti-la parecem funcionar apenas para alguns? Como manter viva a esperança, se os processos se arrastam enquanto vidas se perdem nas calçadas?

É preciso dizer com clareza:
A justiça que não alcança os pobres não é justiça — é privilégio disfarçado.
A tolerância com a negligência é cumplicidade.
A lentidão diante da dor é omissão.

 

Provoco a todos nós, como sociedade e como Igreja:
Estamos realmente comprometidos com a justiça, ou apenas com a aparência dela?
Quantas vidas precisam ser perdidas para que decisões firmes sejam tomadas?
Que tipo de fé professamos, se ela não nos move a exigir que o direito seja para todos, e não apenas para os que têm voz e influência?

 

A missão pastoral também é vigília. É estar atento aos sinais de injustiça e não se calar. É sustentar a esperança mesmo quando tudo parece conspirar contra ela. Porque o Evangelho não é neutro — ele é força que denuncia, que liberta, que transforma.

Peço que continuemos unidos em oração e ação, para que nossa cidade seja cada vez mais espaço de justiça e dignidade. Que possamos ser Igreja em saída, como nos convida o Papa Francisco — uma Igreja que não teme sujar os pés na lama da exclusão, mas que se alegra em caminhar com os últimos.

Com carinho e esperança,

Carolina Maria Lopes de Andrade

Coordenadora da Pastoral do Povo da Rua em Olinda/PE

Contatos: (81) 98102.7697   E-mail: ppr.olinda@gmail.com

 

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